Aquele sim era um grande time

Lembro-me como se fosse hoje das defesas de Dinei, dos bons passes dos laterais Amaral e Pará, da incrível noção de posicionamento dos zagueiros Paulo e Vandinho, dos gols cada vez mais bonitos de Feição, apelido dado para ressaltar suas características mais aparentes: a feiúra e a enorme boca, e de todo o resto do time que jogava de forma magistral em todo campeonato que disputava.
Esse era o time, da divisão de base, do Onze de Ouro. Um dos clubes de maior tradição no bairro.
Eu era o zagueiro reserva dessa fantástica equipe junto com Digão, meu companheiro de banco, que apesar de ser um cara muito querido por todos tinha o seu enorme sobrepeso como fardo para nunca jogar bem.
Meu nível técnico sempre foi mediano demais perto das façanhas que Paulo e Vandinho realizavam a cada jogo. Eles eram a dupla de zaga perfeita, por isso nunca tive muitas esperanças de ter oportunidades como titular em campeonatos grandes como o que estávamos prestes a disputar naquele mês em que todas as principais equipes da região iam jogar.
No tão esperado dia pessoas chegavam de todos os cantos da cidade aglomerando-se ao redor do pequeno campo onde os jogos iam ser disputados.
Meia hora antes tínhamos nos encontrado na casa do treinador para tomar um leve café da manhã e para pegar os uniformes dos profissionais do Onze de Ouro. Os mesmos que os nossos pais utilizavam nos jogos oficiais da equipe.
Porém, na preleção do treinador antes da pequena caminhada de 3 minutos até o campo, a falta do capitão e titular absoluto da vaga foi sentida.

-Onde esta o Vandinho?
Perguntou o treinador.
-O pai dele disse que já esta o trazendo de carro.
Disse Paulo, o companheiro de zaga e melhor amigo.

Mas quando Vandinho entrou pelo portão da casa ninguém conseguiu esconder a surpresa de vê-lo mancando escorado pelo pai.

-Vandinho o que aconteceu?
Perguntou o treinador
-Fui trocar uma lâmpada para minha mãe ontem e torci o pé quando cai da escada. O médico disse que só poderei jogar semana que vem.
-Você não jogará na estréia então?
-Não.

Naquele momento várias visões me assustaram: os rostos dos membros do time que pareciam crianças que acabaram de ser abandonadas pelos pais, o de Vandinho por só poder ter a chance de corresponder às expectativas na semana que vem e a de seu pai que não ia poder ver a estréia do filho no campeonato. Mas nada me surpreenderia mais do que o anuncio do treinador, após um interminável minuto de silêncio.

-Raphael você será o titular!
Atirando-me a camisa 4 enquanto sentenciava o meu fardo.

Alguns minutos depois estávamos chegando ao campo devidamente uniformizados. Era um belo uniforme amarelo com inscrições pretas. Uma em particular, apesar de pequena, sempre chamava atenção. Lia-se na gola: Bebedores por excelência jogadores por teimosia.
A tabela dos jogos naquele dia foi a primeira coisa que todas as equipes procuravam e ela mostrava que o nosso primeiro jogo seria o mais difícil da primeira fase: Onze de Ouro x Bug do Milênio, um clássico do bairro que era sempre mais disputado devido a uma velha rixa entre Vandinho e Alan.
Alan era o atacante do Bug que perdeu sua namorada para Vandinho dentro de uma famosa casa de show na cidade. Os jogos entre os dois times, desde então, sempre tiveram toques de clássico com porradas, faltas desleais e todos os ingredientes necessários para se fazer um grande jogo.
Tendo posto essas condições de jogo, adivinhem quem seria o substituto do Vandinho naquela manhã?
A pessoa que receberia toda a ira de meses acumulados de raiva por uma namorada roubada?
Aquele que só não seria morto se uma improvavel substituição pelo meu companheiro de banco Digão fosse efetuada?
Eu.
Tremia como um gladiador ao ser mandado para a batalha no coliseu de Roma lotado.
Entramos no famoso “campo do caroço”.
Lá a grama se resumia a um pequeno amontoado nas extremidades de cada canto e todo resto era composto de pura terra batida. Uma queda ali se traduzia facilmente em joelhos e mãos ralados, isso é claro, com muita sorte.
Ahh, e eu podia ver no rosto de Alan a avidez em me dar uma bela porrada e me deixar sem andar por uns bons dias naquele jogo. O olhar dirigido a mim era mortal e eu podia quase ler o pensamento dele: Hoje alguém vai pagar pelo que o Vandinho me fez e o escolhido foi você moleque.

(CONTINUA)

3 comentários:

Felipe Attie | 15 de fevereiro de 2009 às 13:21

Prefiro Baseball

Gabriela Domiciano | 26 de fevereiro de 2009 às 11:17
Este comentário foi removido pelo autor.
Gabriela Domiciano | 26 de fevereiro de 2009 às 11:18

Ahhhh!!
A menininha estava torcendo para o Onze de Ouro!!!!

=D

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