Coração de lata


Ainda fico encantado ao recordar.
Exuberante nos gestos mais sutis. A personificação de tudo o que sempre quis.
Era de aço, mas ali percebi residir minha porção de lata.
Perdi para o amor da vida.
Espantando tudo o que tentava me impregnar, aprendi a fundir os metais.
No mais profundo efervescer joguei tudo o que tinha.
Dos mais pesados aos mais leves. Sorriso, cheiro, felicidade, beijo... Estava tudo lá.
O tempo passou e a sensação mágica voltou.
Impedi a conclusão de tudo o que julguei como certo. Voltei a ser lata.
Nada poderia me impedir agora. Nem o meu fraco coração.
Anunciou-se. Teria feito eu a decisão errada mais uma vez?
Não!
Por menos nobre que fosse o metal que escolhi. Como podia estar tão errado?
Enferrujado e arranhado, ancorei todo meu metal numa escolha óbvia, mas não certa.
Ainda tinha cravado aquele nome profundamente em minhas engrenagens.
Mantive-me de pé e mesmo sem poder, sorri ao vê-la livre.
Pensei, duvidei, espantei e decidi. Não se pode continuar indo para um lado quando seu coração aponta para outro.
Foi difícil. Quase impossível, mas fiz.
Todas as minhas energias estavam apontadas para sua direção.
Mais uma vez.
Então veio minha maior decepção. A verdade não bastava.
Havia uma incredulidade absurda em seu olhar.
Ali não residia mais a pessoa que conheci.
Era só raiva e decepção. Não havia mais confiança, vontade ou cumplicidade.
Minha sinceridade e a verdade dos meus atos não importava, pois seus olhos só viam mentira.
Fui um canalha com quem não merecia. Voltei para tentar amenizar meu erro.
Esperava ser escorraçado.  
Tentar de volta algo que tinha acabado de jogar fora?
Mas ali encontrei justamente o que procurava.
Na verdade, mesmo após minha escolha, tudo o que sempre quis continuou ali.
Só eu não vi.
Ainda tenho os arranhões em minha parte lata.
Sei que jamais irão sumir. Mas aprendi a conviver com eles.

Por mais que ainda sinta doer o ranger das ferrugens aprendi a conviver com elas. 

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